Colestase neonatal: novas perceções sobre fisiopatologia e estratégias para melhorar o diagnóstico e prognóstico dos doentes


Ermelinda Santos Silva
Pediatra

Ermelinda Santos Silva, especialista em Pediatria, integra a Unidade de Gastroenterologia do Serviço de Pediatria do Centro Materno-Infantil do Norte, CHUPorto.
Doutorou-se em Ciências Médicas no ICBAS-UP em março de 2022, sob a orientação da Professora Doutora Ana Isabel Lopes e coorientação da Prof. Doutora Alice Santos Silva e da Prof. Doutora Esmeralda Martins.

O que é a colestase neonatal?

A colestase neonatal (CN) é uma síndrome rara (incidência 1/2500) mas que assume grande relevância pela elevada morbilidade e mortalidade associadas (mortalidade ~10% aos 12 meses vida), com muitos doentes a sobreviver na dependência de transplante hepático. Atualmente, a CN permanece um relevante desafio clínico, quer pela significativa percentagem de diagnósticos tardios entre recém-nascidos (RN) e lactentes ictéricos, quer pela abordagem diagnóstica desafiante devido à grande diversidade de entidades subjacentes, algumas das quais raras e com necessidade de tratamento específico.

Qual é o principal objetivo do estudo?

Esta tese teve como principal objetivo contribuir para melhorar o diagnóstico e prognóstico dos doentes com CN, tendo incluído cinco estudos originais (três retrospetivos e dois transversais, um deles com recrutamento prospetivo), uma descrição de dois casos clínicos e uma carta ao editor.

Quais foram os principais resultados do estudo?

Um estudo com profissionais de saúde (médicos e enfermeiros) mostrou que a especialização em Pediatria foi a única variável independente significativamente associada a uma melhor capacidade para reconhecer fezes acólicas (um dos sinais clínicos de colestase).
O estudo retrospetivo, que incluiu uma coorte de 154 doentes portugueses, evidenciou modificações epidemiológicas significativas nas últimas décadas. Mostrou também que, apesar da redução significativa da idade de reconhecimento de CN, as taxas de sobrevida global e com fígado nativo não melhoraram significativamente. A título ilustrativo, foi incluída a descrição de dois casos clínicos de uma entidade rara tratados inovadoramente com enzima de substituição.
A análise de parâmetros clínicos e bioquímicos no momento da admissão hospitalar dos doentes desta coorte permitiu identificar parâmetros com valor diagnóstico e prognóstico preditivo, bem como desenvolver modelos inovadores de diagnóstico de algumas entidades subjacentes e preditivos de prognóstico desfavorável. Com base nestes modelos preditivos, na experiência pessoal e na evidência disponível na literatura, foram construídos dois algoritmos de abordagem diagnóstica.
Finalmente, o estudo transversal com recrutamento prospetivo de lactentes saudáveis de 2 meses de idade sugeriu de forma inovadora que o perfil de ácidos biliares no plasma no início da vida pós-natal pode ter influência na regulação do estado redox (e/ou vice-versa) e no turnover de eritrócitos. Sugeriu também que o aleitamento materno exclusivo em humanos pode associar-se a um atraso na maturação do perfil dos ácidos biliares, potencialmente contribuindo através deste ou outros mecanismos para um melhor estado redox.


Que contribuições para a prática clínica poderão resultar deste estudo?

Nesta tese, são propostas várias medidas potencialmente implementáveis na realidade portuguesa, nomeadamente a incorporação do Cartão de Cores de Fezes de Taiwan no Livro de Saúde Infantil e Juvenil Português (tendo para tal sido obtida a autorização da autora e do Ministério da Saúde de Taiwan).
O futuro passa por aprofundar o conhecimento da fisiopatologia da CN através de linhas de investigação envolvendo o binómio mãe-filho em detrimento de apenas o RN/lactente com CN, rumo à medicina de precisão e prevenção.

Consulte a versão integral: https://hdl.handle.net/10216/140705